Evelyn Castro: De um jeito que você nunca viu

“O humor salva e eu amo, mas meu sonho é fazer um personagem mais sério, uma vilã”

Evelyn Castro, que impressionou o público da TV Globo com sua voz no programa “Fama 4”, segue causando impacto no cenário artístico em todo Brasil. “As pessoas me questionam: ‘nossa não sabia que você também cantava’. Sim, a música é muito mais do que uma parte da minha vida. Às vezes eu acho que prefiro cantar do que falar. Eu não sou comediante, sou atriz e cantora. É que no Brasil parece que você não pode ser duas coisas”, brinca. A artista que já interpretou papéis importantes nos musicais, como “Tim Maia”, “Cássia Eller”, “Vamp”, entre outros, despontou para o sucesso em 2017, quando integrou o elenco fixo do “Porta dos Fundos”, sendo uma das atrizes protagonistas do canal, até os dias atuais.

Recentemente ela comemorou outra conquista: deu vida à personagem Deusa em sua primeira novela, “Quanto Mais Vida, Melhor!” na TV Globo. Ela não para, e segue conquistando espaços importantes e divertindo o público na televisão, no teatro e também no cinema. Participou da série “Um contra todos”, na FOX Premium, onde interpretou uma perua, casada com um político. No cinema estrelou os longas, “Tô Ryca 2”, onde fez a antagonista, ao lado de Samantha Schmutz, “A Sogra Perfeita”, ao lado de Cacau Protásio e “Juntos e Enrolados”, ao lado de Cacau Protásio e Rafael Portugal. Na Netflix, atuou na série “Mecanismo”, onde interpretou a cunhada “Laranja”, do doleiro. Participou da série Matches, uma produção da Migdal Filmes para a Warner Channel, na qual interpretou uma das protagonistas, ao lado de Juliana Silveira e João Baldasserini. No teatro, ela brilhou no musical “Quebrando Regras – Um tributo a Tina Turner – Uma comédia musical”, onde foi indicada a vários prêmios pela sua performance. Vive a hilária “Marraia Carey”, na série cômica da Multishow “Tô de graça”, ao lado de Rodrigo Santana e agora volta à TV, com sua nova personagem, “Maria Augusta”, na série da Globoplay, “Encantados”. Ufa! Em tempos que o riso nos salva e que precisamos rir (diga-se de passagem) ela nos recebeu para uma entrevista exclusiva e falou sobre tudo: carreira, estereótipos, preconceito, música, maternidade e fé.

O “Porta dos Fundos” foi um divisor na sua carreira, certo?
Sim, foi um divisor de águas na minha vida e ainda é. Eu era fã de todos e nunca poderia imaginar que pudesse fazer parte do elenco. O convite aconteceu depois que eu fiz um filme e o Fábio viu o anúncio no cinema e começaram a me chamar para participar. Nesse trabalho a gente fica em evidência direto porque temos a oportunidade de fazer vários personagens, várias formas e estamos em destaque o tempo todo. Dessa forma tem sempre alguém assistindo alguma esquete, estamos sempre em contato com grandessíssimos roteiristas, diretores, cabeças pensantes, enfim. Eu vejo o Porta dos Fundos
como um cérebro gigante em funcionamento e usando da ferramenta do humor pra fazer com que a gente pense em bastante coisa, de uma forma leve ou muitas vezes não. Mas sim, é um divisor de águas na minha vida. Gigantesco.

Na sua opinião, por ter atuado no humor por muitos anos fica um estereótipo?
Olha, existe, né? Existe esse estereótipo no mercado da gente atuar, quem faz humor não faz outra coisa. Eu gosto muito de fazer humor, gosto do que faço no Porta dos Fundos que é algo mais
cotidiano, gostei muito do que fiz na novela porque pude levar um pouquinho desse humor pra personagem da Deusa e em cena os diretores enxergaram que eu podia ir além, sabe? Claro, espero continuar tendo a oportunidade de fazer humor, mas quero sim ter mais oportunidades de fazer personagens mais profundos. O humor só traz coisa boa, ele traz leveza, mas eu espero ainda fazer uma vilãzona, uma coisa séria. Eu não reclamo não de fazer humor, mas um estereótipo ainda existe, né… desiste até a gente conseguir quebrar essa barreira de que a gente nós a que fazemos humor, né? As pessoas às vezes falam ‘você é comediante’, não, eu faço humor também, mas não só isso. No musical eu tive a oportunidade de fazer outras coisas, eu fiz drama, eu fiz humor também e tava lá em cima do palco fazendo. Então todo mundo diz: como assim você é cantora? É atriz? Faz humor? Como é que é isso? Eu ouvi uma expressão maravilhosa que eu nunca vou esquecer e eu vou levar pra vida. Um cara escreveu assim num vídeo meu cantando Foo Fighters né? Cara, eu bugguei, parece que eu tô vendo o Zacarias cantando Slipknot. No Brasil as coisas são assim, essa frase resume muita coisa.

Existe algum personagem ou trabalho que sonhe fazer? Por quê?
Ah eu tenho sim, eu tenho eu tenho personagem que eu sonho em fazer, eu sonho em fazer a Dercy.
Apesar de já terem feito muito bem feito por sinal, eu sei que já houve um seriado dela, eu fiquei apaixonada na história dela e tenho essa vontade. Fiz um espetáculo baseado nas histórias da Tina Turner e também realizei um sonho e devo voltar com ela em cartaz logo com essa produção. Mas eu falo na Dercy porque ela foi um ícone assim como Hebe, Nair Belo são grandes nomes no Brasil. E sim, eu ainda sonho em fazer algum personagem mais sério, imagina uma vilã? Eu iria me dedicar bastante.
O gosto pela música foi revelado desde cedo e você falou sobre o espetáculo em homenagem à
Tina Turner.

A música é mais um amor na sua vida?
A música faz parte da minha vida, é como se fosse respirar, é como se fosse falar. Eu prefiro cantar
muitas vezes do que falar. Sempre foi assim em vários aspectos da minha vida, no espiritual também. Foi uma das coisas que me levou até a determinada religião. Quando eu frequentei a igreja católica na época foi por conta muito da música. Eu amo cantar e é mais uma área em que dou tudo de mim.

Depois do humor pela internet com o “Porta dos Fundos” estrear em uma novela da Globo foi um
sonho realizado?
Sim, é um sonho realizado e eu amo o formato tão rico, foi tão maravilhoso, foi uma equipe tão incrível,
conheci pessoas tão maravilhosas, isso falando na equipe toda, desde os diretores, bastidores até elenco. Só de falar me emociono e estou até gaguejando porque me empolgo mesmo. A Deusa foi mais que especial e com certeza quero fazer novamente outro trabalho em novela sim. Essa personagem, essa história, a experiência, tudo me encantou também pela confiança que depositaram em mim, já que eu pude estar ali inteira, entregue, e ainda sem falar na possibilidade de acrescentar ao enredo com minhas doideiras e sugestões. Foi uma construção em conjunto e isso foi muito gostoso.

Sofreu algum preconceito na ascensão da carreira? Por que o cenário do humor no Brasil é dominado por homens, certo?
O que que não é dominado pelos homens, né? Eu falei outro dia até com meu filho de uma forma
bem estressada que eu estava exausta. Nós vivemos numa sociedade que não foi criada para as mulheres, ainda é uma sociedade para os homens. Eu convivo com os caras, os donos do Porta dos Fundos que estão abertos a pelo menos sempre nos ouvir, lá pelo menos a gente tem importância e isso é fundamental. Eu sofri mais gordofobia do que preconceito no humor, acredita? Porque um homem gordo é “aceitável”, mas uma mulher, não. Quando entrei no Porta sofri pelo peso, as pessoas falavam ‘quem é essa gorda sem graça’. Eu estava 23 quilos acima do meu peso porque tinha acabado de ganhar bebê e me julgavam por isso e isso foi por baixo mesmo… Estou falando por cima só porque foi muito mais profundo do que estou dizendo. Eu precisei parar de ler os comentários e decidi insistir e viver minha vida. Mas foi muito doloroso isso, sim. A mulher sair do lugar de objeto é complicado e é uma luta diária. A gente prova que é mais que um pingente pra exibir e badalar por aí. Sofri preconceito sim, mas hoje graças a Deus conquistei meu lugar. Tô ficando triste já, gente… Vamos pra próxima pergunta? Rsssss….

Como atriz que faz muito humor, precisamos saber: existe limite pra uma piada?
Existe, existe limite, sim. Existe limite pra tudo na vida e existe limite pro humor também. Acho que tudo
que denigre, tudo que não vai ser um serviço a favor daquela situação eu acho que não tem que ser feito. Então acho que é aí que está o limite, mas também acho que o humor de certa forma faz a gente parar pra pensar, sabe? Mas temos que tomar muito cuidado com esse limite, o tempo todo, sim.
Em uma de suas entrevistas, vocé já declarou que sempre gostou de fazer as pessoas rirem.

O humor salva?
Sim, o humor salva. Eu por exemplo quando fui no programa do Porchat contei sobre o enterro do meu pai e falo com todas as letras, se eu não tivesse humor, não sei o que seria de mim, foi o humor que me salvou naquele momento. Foi um momento muito difícil de diversas formas e o humor me salvou. Eu tenho uma amiga que a gente já passou tantas coisas juntas e muitos períodos difíceis, a Cláudia Cunha e somos a prova disso. O humor salva. O humor traz leveza. O humor faz com que a gente dê risada da gente mesmo. Então, tira a gente do lugar de vítima muitas vezes e ele na minha vida é fundamental.

Na Infomente falamos muito em saúde mental. O que você faz para manter o equilíbrio?
Bom, cara, pra entrar em pra entrar em equilíbrio só fazendo análise e eu mantenho em dia minha terapia. E eu acho isso fundamental. Esse é meu equilíbrio mental e faz com que eu possa me amar e depois, amar as outras pessoas. Eu tenho aprendido muito isso: não adianta a gente falar que ama, por falar. É preciso amar a si mesmo pra depois amar os outros. Se você não está feliz consigo, não vai amar ninguém, só vai destilar ódio por aí. Então esse é pra mim o equilíbrio fundamental. E deixando claro que Deus está em tudo isso aí que eu falei. Porque muita gente fala da espiritualidade. A espiritualidade está na minha análise, na minha praia e no meu treino. isso é constante. Eu chamo de Deus, cada um
chama do que quiser, né? Aí está meu equilíbrio.

O que pode adiantar sobre seu novo trabalho na Globoplay? É uma personagem
desafiadora, não?
Posso adiantar que aquilo é incrível, a gente vai falar de subúrbio, a gente vai falar da minha verdade, né? Porque eu tenho muita verdade ali no subúrbio, eu tenho amigos do Méier, eu sou nascida e criada na Tijuca apesar da Tijuca não se intitular subúrbio… Desculpem, Tijucanos…rssss… Enfim, minha personagem é desafiadora porque ela é completamente diferente de mim em vários quesitos: ela é muito piriguetinha e além de tudo, ela é pra frentex. Em todos os personagens eu busco uma identificação e eu me encontrei com ela no quesito de que ela é completamente fútil, totalmente preocupada com a estética e ela tá sempre em cima dos saltos e sempre prezando por uma imagem e eu sou muito mais simples, sempre… Isso foi um exercício e desafio: ficar o dia inteiro no salto alto, tentando entender quem era essa mulher de unhas enormes. Adoro fazer parte disso, sair da zona de conforto, me vestir por inteiro de uma personagem diferente, isso me alimenta. É bom colocar uma sandália de passista de escola de samba e um costeiro pra ver como é que são as coisas e o que essas pessoas vivem também e os sonhos que essas pessoas vivem e como eles são embalados. Foi incrível mesmo.

Você é uma mãe presente, mostra isso nas redes. O que a atriz tem da mãe e vice versa?
Posso dizer que é exaustivo. O Juan também é teimoso e isso eu tenho da teimosia e ele também tem e a gente brinca que compete nisso, um teimando de um lado o outro do outro e passamos o dia inteiro… rssss… Eu gosto de educar meu filho, gosto de estar perto do emocional dele também, dou muito valor a
isso. Não tem riqueza maior do que ver ele se tornar um grande homem, porém enorme, de um coração enorme. Tem trabalhos que querem me xingar com certeza (não tenha dúvidas) se não tiver algumas coisas hoje em dia eu falo que se não encaixar na minha logística eu não faço e eu acho que a sociedade precisa entender muito mais. A gente tem que parar de ser militante na internet mudar a nossa sociedade, sabe? Eu sou uma mãe solo, eu sou sozinha, cada hora tenho que reinventar a minha rede
de apoio dentro da loucura que é meu trabalho e é meio complicado. Sempre vem a segurança e proteção do meu filho em primeiro lugar, mas Juan é um cara que já vive nesse meio dos palcos e eu
respeito e amo muito os lugares em que eu trabalho, o “Porta dos Fundos” por exemplo é um local “criança friendly”, ou seja, está à frente e acho que as pessoas precisam aprender a lidar com
isso, sabe? Mães solo precisam de apoio pra trabalhar. Atrizes que param porque são mães e querem ser mães presentes, isso é fundamental então fica aqui meu protesto.

Por atuar com humor você já passou por alguma saia justa? Em algum evento ou festa?
Já com certeza passei por algumas saias justas. Só o “Porta dos Fundos” coloca a gente em inúmeras saias justas. Religiosas então, é muito ódio e muito exorcismo que eu sofro. Mas eu já passei por uma situação muito engraçada em que eu estava indo buscar meu filho na escola e quando eu estava chegando na porta me passa um carro que grita: “Ei, tu é amiga do Piroca?”. Todos os pais que estavam na porta da escola olharam pra minha cara sem entender eu comecei a rir acenei e continue caminhando com a minha cabeça erguida e agradecendo e xingando ao mesmo tempo a “Porta
dos Fundos” dentro de mim. Por conta de um vídeo que eu fiz com o Greg que ele falava que agora o apelido dele era piroca.

Você é verdadeiramente uma atriz camaleoa, aquela que se permite vestir do personagem completamente. Como vê a questão de por exemplo influencers estarem atuando em novelas?
Olha, eu penso a seguinte coisa, cara: quem sou eu pra falar alguma coisa? Quem sou eu pra achar que a gente pode optar, opinar e falar da vida das  outras pessoas? Desde a minha infância eu sempre quis ser atriz, nunca cantora por que a música pra mim sempre foi algo que me preenchia, mas meu caminho foi o inverso. Hoje existe uma movimentação tanto na TV quanto nos streamings e com a Internet temos que estar abertos à diversidade. É preciso aprender que uma coisa não anula a outra: o fato de eu ser
atriz e depois cantora, não desmerece ou descaracteriza uma coisa ou outra.  Eu quero muito ver outras mulheres assumindo outras posições sem ser as mesmas. Quero ver gente influenciando os outros e se reinventando. Se amanhã eu quiser ser influencer e der certo? Vão também falar que eu não posso? Porque eu comecei como atriz de Porta dos Fundos entende?Não faz muito sentido. Bora viver, produzir, se reinventar, fazer o bem e trabalhar.

O que faz quando acorda de mau humor? (rsssss desculpa, a gente precisa saber porque falamos em saúde mental e equilíbrio e sua imagem é ligada à alegria).
O que eu faço quando eu acordo de mau humor? Gente, mas isso depende muito do horário. Se a gente for falar assim de acordar seis da manhã, sete da manhã, oito da manhã até nove da manhã Deus me fez assim, posso fazer nada. Que eu faço? Me calo e peço que ninguém fale comigo. A única coisa que eu peço, aliás, eu tenho espalhado isso em entrevistas: por favor, não é pessoal. Eu não estou olhando você de cara feia. Eu não estou falando com você porque eu não quero falar com você. Eu simplesmente não falo. Eu fico em retiro de silêncio praticamente. Esse é o meu equilíbrio pra que meu corpo vá entendendo que eu acordei e que eu sou obrigada e que eu tenho que fazer aquilo ali e que eu estou viva e que é isso. Essa é a verdade. Mas quando eu acordo de mau humor eu procuro o silêncio, total o silêncio. Já brinquei várias vezes que de manhã cedo eu sou o palhaço crush dos Simpsons…Quem viu, sabe. Pronto, falei.

** Este texto não necessariamente reflete, a opinião deste portal de noticias