O bom filho, pai, marido, artista e “maluco” (segundo ele)
Por: Renata Rode | Fotos: Mike Bonfim
Falar de Nizo Neto é algo praticamente impossível, porque ele é um artista mais que completo e precisaríamos de pelo menos duzentas páginas de revista. Ator, roteirista, dublador, radialista, comediante e filho do mestre Chico Anysio, ele herdou o talento e polivalência da família, afinal, começou a trabalhar aos sete anos de idade, ao lado do pai. Aliás, ele deu continuidade ao legado do saudoso comediante e reflete: “Colocaria meu pai entre os dez melhores comediantes do mundo, pelo menos e mesmo nos dias atuais porque como ele não existiu. Foram mais de duzentos personagens e o mesmo objetivo: levar alegria”, diz Nizo.
É claro que ao ser questionado sobre o melhor trabalho, ele responde sem dúvida alguma: a eterna escolinha. O programa uniu pai e filho durante muitos anos e foi uma febre durante a década de 1980, tanto que mereceu remake décadas depois. “Depois da ‘Escolinha’, eu fui começando a ver que as pessoas riam muito das coisas que eu falava e realmente resolvi sair do armário como comediante. Talvez eu tenha relutado um pouco, porque a pressão é grande, né? Fazer humor sendo filho do Chico Anysio, não é fácil… Mas não me arrependo de forma nenhuma e sigo aí hoje com uma ótima carreira como ator e comediante”, relembra o artista.
“São 50 anos de carreira, eu comecei na TV preto e branco, quase muda” brinca o artista multifacetado.
O artista, irmão dos também humoristas Bruno Mazzeo e Lug de Paula, foi o filho que mais acompanhou a carreira de Chico Anysio de perto e parece carregar consigo o que viveu com o seu pai adiante: no teatro, ele viveu a experiência de contracenar com a filha, Sofia. “Ver ela se entregar e atuar, assim, diante da plateia, é um ato de muita coragem. E eu fiquei muito, muito feliz com essa experiência”, conta. Aos 11 anos, a menina interpretou a Talia Total na peça “Escolinhazinha do Professor Raimundo”, vivida pela atriz Claudia Rodrigues na TV. O ator viaja o Brasil com a comédia dramática “Nunca desista de seus sonhos” e, em janeiro, a produção retoma a temporada em São Paulo. Esse é mais um desafio na trajetória do ator: encarar dois personagens, um empreendedor falido que luta contra o estigma de ser um derrotado e o próprio escritor Augusto Cury, já que o texto é baseado no livro homônimo do médico psiquiatra, considerado o autor mais lido da década.
“Interpretar o Cury é um privilégio porque, não só é o autor da peça, é o principal biografado da montagem, vamos dizer assim, porque a peça não deixa de ser um pouco a biografia dele, mas é incrível porque é um cara extremamente bem-sucedido. E é uma pessoa incrível! Um presente poder fazer esse personagem, ainda mais porque eu estou muito acostumado a fazer comédia, né? Isso mostra um lado diferente meu como ator”. Haja holofote para tantos lados, já que Nizo não para.
O polivalente está também à frente do seu podcast Nizológico, no Youtube; também escreveu e encena o stand up Atrocidades; em 2018, Nizo e sua esposa Tatiana Presser participaram da terceira temporada do reality show Power Couple Brasil, na RecordTV; apresenta a palestra motivacional “Histórias de Chico: O Segredo do Sucesso do Mestre do Humor” e, seu mais recente trabalho, como protagonista em dublagem, é a série Cobra Kai (Netflix), em que dubla o ator Ralph Macchio.
Sobre o humor estar em constante provação, Nizo é enfático e diz que a sociedade se beneficia de tudo isso há séculos. “Podemos dizer que dá para fazer humor da tragédia. Chaplin nos ensinou e nos ensina ainda muito bem com seu célebre personagem, o vagabundo, no qual o humor e a tragédia se entrelaçam bem; os palhaços também nos ensinam muito isso e o humor salva. Meu pai dizia uma frase muito interessante que era que ‘nós, comediantes, somos médicos da alma’, e é a mais pura verdade”, revela.
Para ele, a mudança do humor com a evolução das mídias é algo natural. “A televisão aberta como era está com dias contados, porque a internet chegou devastando tudo. A TV migrou para a internet e isso também aconteceu com o rádio com o surgimento da televisão, que acabou virando um veículo de comunicação e notícias, com pouco entretenimento, falando na dramaturgia que existia antes, ou seja, tudo se adaptou e o mesmo acontece hoje em dia. O telespectador escolhe o que e quando assistir, mas, é claro, é preciso levar em conta que somos um país muito pobre e que pouquíssimas pessoas têm acesso à internet”, relata. Fora do meio artístico, Nizo Neto é bem família e daqueles homens todo apaixonado. Casado com a sexpert e psicóloga Tatiana Presser, eles são a pura representação da cumplicidade e do amor. Ambos fizeram sucesso no teatro com a peça “Vem Transar com a Gente”.
Na montagem, o casal apresenta situações divertidas sobre sexo, que permeiam a vida de milhões de brasileiros. Aliás, eles são sócios em uma grife de produtos eróticos exclusivos e falam sobre sexo saudável de maneira didática e orgânica, sem rodeios. Obviamente perguntamos se é possível ser feliz trabalhando junto com a esposa, ou seja, estando junto em casa e no trabalho e ele respondeu de bate-pronto: “O segredo é ter cumplicidade e canal de diálogo aberto. Sem conversa, nada se resolve”, ensina. Eles são pais de Isabela e Sofia. É claro que também batemos um papo sobre saúde mental com Nizo, já que a rotina do artista é um tanto quanto avassaladora. “Mantenho minha saúde mental com três ‘tes’: Terapia (sim, a minha está sempre em dia), Teatro (porque essa troca entre artista e público é extraordinária) e Tatiana (a esposa)”, responde rindo, e continua: “Como bom artista, sou meio maluco. A gente não tem cura, só faz manutenção”.
Antes de continuar a conversa sobre carreira e vida, fizemos questão de provocar o bom moço perguntando o que o movimenta atualmente e do que ele tem preguiça e a resposta foi esta: “Boletos são um bom estímulo para nos movimentar. Fora isso, o desafio de ter que se reinventar o tempo todo para se manter no mercado. Preguiça atualmente é de gente burra e fundamentalista”. Além das filhas, Nizo Neto também é pai de Rian, falecido em 2016. Constantemente, ele faz homenagens nas redes ao menino: “Sem dúvida nenhuma, é o que eu tenho mais saudade na vida”, conta.
Quando exatamente você se apaixonou pela comédia?
Comecei na TV muito cedo, com o meu pai; eu tinha 8 anos de idade. A TV era em preto e branco ainda. Eu demorei um pouquinho, não levava muito a sério, pois ainda era muito criança e não sabia direito o que eu ia fazer. Mas posso dizer que me reconheci mesmo como artista em 1980, quando eu fiz a minha primeira peça profissional. Como humorista, ainda demorou mais, porque eu queria ser galã de novela, não me achava engraçado. Depois da ‘Escolinha’, eu fui começando a ver que as pessoas riam muito das coisas que eu falava e realmente resolvi sair do armário como comediante. Talvez eu tenha relutado um pouco, porque a pressão é grande, né? Fazer humor sendo filho do Chico Anysio, não é fácil… Mas não me arrependo de forma nenhuma e sigo aí hoje com uma ótima carreira como ator e comediante.
Como é fazer parte de um legado tão importante deixado por seu pai?
Ser filho desse cara foi a coisa mais incrível que aconteceu na minha vida. Ele era um dos grandes, senão um dos maiores nomes da nossa cultura popular. O que ele fez como comediante, eu falo isso, sem modéstia e sem banca, o que ele fez, no mundo, ninguém fez. Eu estudo o humor, acompanho e ninguém fez o que ele fez. É motivo de muito orgulho, ser filho do Chico Anysio.
Além de mestre , ele é sua inspiração?
Com toda a certeza. Ele foi a minha grande referência. A minha grande inspiração, não há dúvida. Tudo o que uma pessoa pode passar para a outra, foi ele que me ensinou, e realmente foi uma referência enorme. Eu acompanhei de perto a carreira dele. Posso dizer que fui o filho que mais o acompanhou de perto. E, com certeza, ele foi uma grande inspiração.
Você sofre com as comparações sobre seu pai?
Olha, eu já sofri mais com isso, mas eu já desencanei porque ser comparado com o Chico Anysio é uma coisa tão absurda, tão de uma certa forma covarde, que, se fosse eu filho dele ou não, realmente, não dá, entende? Não dá para as pessoas compararem, porque ele é um cara muito fora do comum. E há uma frase clássica, até: ‘Ah, para aparecer outro Chico Anysio, é daqui 100 anos só’. E se aparecer, porque ele realmente era um cara de uma capacidade, de uma genialidade muito fora do comum.
O Ptolomeu da “Escolinha” é um personagem especial, certo?
Poder trabalhar com aquele pessoal, que, para um cara da minha geração é um privilégio absurdo, a lista de comediantes que participou ali da ‘Escolinha’ é uma coisa muito impressionante… Então, isso aí foi uma coisa que marcou muito. E outra coisa foi que a ‘Escolinha’ me fez famoso. Então, tem uma linha aí de história da minha carreira, e até hoje as pessoas comentam muito sobre a ‘Escolinha’”.
A gente sente falta do humor do passado porque era diferente?
Não tem jeito, o ser humano é muito saudosista. A gente sempre sente muita falta do passado, e passa muito rápido… É uma coisa, assim, que parece que foi ontem. Eu estou sentindo aqui o cheiro do estúdio que a gente gravava a ‘Escolinha’, e sinto muita falta do meu pai vivo, tantos outros colegas também vivos… E na época eu era mais jovem também, não que eu não seja feliz hoje, muito pelo contrário, mas é saudade, a famosa saudade.
Pode nos contar um sonho profissional?
Uma coisa fascinante desse trabalho é que a gente não para. São muitos desafios, muitas coisas diferentes, muita diversidade… Bom, eu gostaria de fazer um vilão, assim, bem mal, tipo um serial killer, bem sanguinário, bem psicopata (risos). Um grande musical também, é uma coisa que eu gostaria muito de fazer. Ah, muita coisa, muita coisa a se fazer nesse ramo!
O que você gosta de fazer no tempo livre?
Eu sou um cara muito caseiro, levo uma vida, assim, posso dizer, ‘pacata’. Gosto de ficar com as minhas filhas e a minha mulher. A gente se diverte e rir bastante junto. Nós somos bem-humorados. E eu acompanho corrida de cavalo também, que é um esporte, assim, estranho… Eu nunca me liguei em futebol, mas assisto corrida de cavalo e não aposto nem um tustão. Gosto mesmo para ver, pelo hobbie. E gosto muito de dançar também, então sempre que a gente pode, eu vou com a Tati para festas. De uma forma geral, eu levo uma vida muito simples.