Na mira da censura

Os anos 70 foram marcados por inúmeras séries contestatórias relacionadas ao golpe de estado civil-militar de 1964, dentre elas a estudantil. Eram momentos em que se buscava uma quebra da moral vigente, atrelada a deslocação dos conceitos de cultura e outros meios que de certa maneira, qualificavam a sociedade, arrebatados pela influência tropicalista musical dos
anos que lhe antecederam. Naquela ocasião, o Estado ditatorial vivia sob o manto e forma da legitimação e controle e, a passos largos usou e abusou da repressão e da censura como um instrumento dissonante à sociedade, porém se justificava como modelo político vigente. Era um “novo” modelo aplicável à sociedade que se sobrepunha sobre o antigo, revestidos com o verniz moral e político, ao qual a sociedade lhe conferia legitimidade. Destarte, era uma atividade “normal”, garantida por lei. A “legalidade” da censura colocava freios rígidos à música popular, cinema, teatro, programação de rádio, atividades circenses e a televisão. De mãos dadas, as censuras política e moral caminhavam juntas, todavia, as censuras lançadas eram vinculadas aos “valores tradicionais da família brasileira”, em defesa da religião, de um modo especial a cristã, contra o uso
de drogas, a homossexualidade, onde os valores do Estado seriam sobrepostos aos civis. Com efeito, a censura fazia parte de um modelo pedagógico cultural de perseguição político-social aos setores marginalizados. Os censores exerciam a função de críticos preventivos da moralidade. Com o advento das Diretas Já e com a promulgação da Constituição de 1988 a ditadura foi deixada no passado para que pudéssemos viver livres no manto da Democracia plena e salvadora. Entretanto, a estória renasceu, após o maior esquema de corrupção do mundo, onde o arquiteto e líder desse grupo depois de condenado em todas instâncias, surgiu como uma fênix graças a decisão remodelada de um judiciário partidário jamais visto na história. Nessa nova fase da ditadura remodelada, os militares foram lançados de escanteio e considerados reles tubos de ensaio, dando lugar os astutos e imponentes “liberais democráticos” que capitanearam as rédeas do totalitarismo atual. Em
verdade, os novos remodeladores da moral-política e social, se impõem ameaçadores àqueles que ousarem cruzar o seu caminho. O novo caráter dar lugar ao egocentrismo e se apropriaram dos meios institucionais para validar seus atos sob a pecha da legalidade. É crível podermos denotar nestes claros sinais de autoritarismo certa semelhança aos utilizados contra os judeus, durante a segunda guerra mundial, onde paulatinamente eram criadas leis subversivas, onde as vítimas só se
deram conta quando não havia mais oportunidade para reverter a máquina da destruição. Diante dessa narrativa, recentemente fomos surpreendidos com a reveladora decisão do TSE em restringir a emissora Jovem Pan de realizar comentários sobre os fatos e decisões envolvendo o candidato Lula das quais ecoam no vale da desproporção, bem como na pitada demasiada de censura. O vértice dessa decisão possui uma roupagem de limitação preventiva, de cujo teor atinge diretamente o princípio da liberdade, a informação, a livre expressão, independentemente de censura ou licença afetas
ao jornalismo. A liberdade constitucional consagrada à imprensa diz respeito à garantia de comunicação de fatos e ideias, o que pressupõe, respectivamente, a liberdade de informação, de expressão e nelas inseridas a crítica e a divergência. Destarte, a competência do TSE para tratar do assunto não lhe permite daí, interpretar críticas jornalísticas como instrumento de censura ao livre debate. O canal Jovem Pan, sempre proporcionou paridade de condições ao candidato Lula, mas, ao revés, este de maneira enfadonha se recusa publicamente em submeter-se às indagações dos comentaristas da emissora. O mundo tem conhecimento da situação jurídica, política e legal atribuída ao “descondensado” Lula,
das quais serviram e servem de gatilho às críticas de muitos comentaristas e de grande parte da população, principalmente diante da possibilidade real e catastrófica do candidato esquerdista reassumir às rédeas da nação. Ademais, as críticas aos fatos vividos por Lula, são verídicos, de conhecimento público e notório. O país vive uma tensão política, ideológica e a Justiça Eleitoral deve manter a razoabilidade, o respeito a interpretação correta da Constituição Federal, sem, contudo, proporcionar condições para a extravagância. É preciso usar as lentes da parcialidade, e, sobretudo, abandonar as paixões pessoais, ainda que existam. A república democrática e a Constituição Federal contemplam aos meios de comunicação condições jurídicas à cobertura e a crítica jornalística mesmo em tempo eleitoral e não vedam de exercer o seu múnus. O mais estarrecedor é tomarmos conhecimento sobre a decisão de uma Ministra da Corte maior, na qual reconhece no julgado o ato da censura, mas se justifica como necessária para o momento é algo que merece notada preocupação por não dizer desespero: “Este é um caso que ainda que em sede de liminar é extremamente grave, porque de fato nós temos uma jurisprudência no STF na esteira da Constituição no sentido de impedimento de qualquer forma de censura. Medidas como esta, mesmo em fase de liminar, precisam ser tomadas como algo que pode ser um veneno ou um remédio”. Por conclusão, não há como negar o conflito irretocável de caráter jurídico ou vice-versa, essencialmente individualista movido por paixões na democracia. E aqui me permito realizar uma adaptação do filósofo Alexis de Tocqueville, que retrata a diferença acima exposta: “enquanto a democracia procura igualdade na liberdade, alguns procuram igualdade nas restrições e na servidão.

Por Dr. Émerson Tauyl
Advogado Criminalista, especializado em Direito Militar e Segurança Pública, com escritórios em São Paulo e Praia Grande
@emerson_tauyl

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