Helio de La Peña fala sobre seus medos, projetos e família
Por Renata Rode/ Colaboração Priscilla Silvestre/ Fotos Ana Quintella / Alexander Landau e Divulgação
Ele é carioca, casado, tem três filhos, é nascido e criado no subúrbio da Vila da Penha. Hoje, mora no Leblon e dominou o Brasil com seu jeito irreverente e único de ser.
Há algumas curiosidades sobre Helio de La Peña que muitos não sabem: uma delas é que ele um “paizão”, daqueles que se denominam “pai coruja”. Outra é que ele é engenheiro de produção, ou seja, quem o vê tão à vontade nos palcos e telas nem sonha que ele já trabalhou em um ramo tão diferente.
Inclusive, ele deixou a engenharia quando foi trabalhar como redator na “TV Pirata”, onde ficou de 1988 a 1990. Também é um dos criadores do aclamado “Casseta & Planeta, Urgente”, que brilhou na TV de 1992 a 2010.
Já atuou em diversas novelas e filmes, mas atualmente está rodando os comedy clubs e teatros do país com seu show solo de stand up “Preto de Neve”.
Ele atendeu a equipe da Infomente para uma entrevista exclusiva na qual fala sobre carreira, família e projetos. Confira!
Assistindo de camarote tantos cancelamentos de colegas humoristas, onde vamos parar? Qual sua opinião sobre isso?
É uma questão complexa. A sociedade mudou, isso é um fato. Certas piadas não funcionam mais, seja porque as pessoas cansaram, seja porque o racismo, o machismo, a homofobia perderam espaço. O comediante está sempre em busca de gargalhada, se ela diminui, o comediante muda de assunto. As pessoas têm o direito de não gostar de determinadas piadas e se manifestar por isso. Porém, acho que não cabe ao Estado definir o que pode o que não pode ser falado num palco.
Te incomoda algum tipo de abordagem que tenha sofrido por estar hoje fora da televisão?
Apesar de estar fora da tevê há um tempo – o Casseta saiu da grade em 2012 – a abordagem do público tem sido carinhosa. De uma maneira geral, demonstram saudades. O que mais escuto é “Que pena que vocês não tão mais na tevê”.
Você sente falta de não estar no ar? Não temos grandes programas de humor atualmente, por quê?
Pessoalmente, acho que se encerrou um ciclo muito vitorioso. Tá tudo certo. A tevê mudou muito. No tempo do programa, a família se reunia em torno de um único aparelho na sala. Hoje está cada um num canto, consumindo produtos diferentes – a oferta de humor aumentou no geral, apesar de ter diminuído na tevê aberta. Mas todos nós recebemos memes, vídeos de TikTok, Reels, YouTube a toda hora. O humor migrou da tela da tevê para tela do celular.
Como você cuida da sua saúde mental? O que faz?
Tento ler, assistir a boas séries, gosto de conversar com minha mulher, meus filhos, meus amigos, procuro levar a vida com bom humor. E pratico esportes. Faço natação no mar com certa frequência, quando os shows permitem, e ainda me exercito com um personal trainner.
Como é ser um preto de sucesso no Brasil? Conte uma situação inusitada que ainda não revelou para ninguém e por favor me fale sobre como se sente hoje com tanto mimimi por aí…
É algo que incomoda algumas pessoas, mas procuro ignorá-las. Moro num condomínio de luxo no Leblon, no Rio. E soube de um vizinho que resmungou dizendo que o nível caiu muito com a minha chegada. Para que se estressar com isso? Apenas me divirto vendo essa pessoa envelhecer mal, sofrendo por idiotices.
Quais os projetos para o ano que vem?
Estou rodando o Brasil com meu show solo de stand up Preto de Neve. Espero ter a chance de apresentá-lo no exterior, para brasileiros que moram em Portugal ou nos Estados Unidos, e que sentem saudades do meu trabalho. Estou lançando um livro com meu amigo, o cartunista Adão Iturrusgarai. “Aventuras de um Pijamão” – crônicas de humor (minhas) e cartuns (dele). Fala sobre casamento, solteirice, sexo, falta de sexo e outras mentiras.
Como é o Helio pai? É coruja? Como é ser um pai famoso?
Adoro estar com meus filhos, hoje todos crescidos – Joaquim 31, João 21, Antonio 19. São conversas ótimas. Mas se for preciso, puxo orelha, dou esporro, ponho na linha. Esqueço esse negócio de ser famoso. Talvez eles sejam bem tratados em algumas situações por isso, mas não sou um caçador de área VIP, nem para mim, nem para eles.
Como você vê essa geração em comparação àquela que gostava de Casseta no passado?
As gerações mudam, a sociedade muda. Começamos a fazer humor nos anos 70, no governo Geisel. De lá para cá, as mudanças foram ocorrendo naturalmente, não é uma característica exclusiva da geração do século 21. Escuto muita gente dizer que era pequeno e assistia ao programa escondido dos pais. Hoje está tudo escancarado, o moleque tem acesso às barbaridades com seu celular. Mas acho que tudo é uma questão de como você forma seus filhos. Eles querem limites definidos e ficam muito inseguros quando podem tudo. Os pais têm que ser o primeiro obstáculo, mesmo que seja para ser superado. Ou o limite será dado por um policial na rua ou por um poste, num acidente.
Como é ser humorista? As pessoas vivem pedindo pra que você seja engraçado o tempo todo?
Sou uma decepção. Aviso logo que não sou animador de mesa de bar. Não vivo contando piadas. Quem esperar isso vai ficar desapontado comigo.
Qual o lado bom da fama? E o ruim?
É ótimo ser querido pelo povo. Mas também é péssimo saber que está sendo observado o tempo todo. Chato não poder tirar uma meleca do nariz sossegadamente.
Já aconteceu algo estranho por ser humorista famoso? Conta para a gente uma situação que te deixou em saia justa.
O mais comum é me confundirem com outros artistas. Já fui Seu Jorge, Benjor… Já passei por situação em que a pessoa insistiu tanto que eu era o Luís Miranda, que desisti e concordei.
Um preto fazendo sucesso e humor no Brasil: como é isso? Fala para gente um pouco dessa superação e a que custo você chegou aonde chegou?
O sucesso e o reconhecimento público te tiram da invisibilidade a que os pretos de forma geral são submetidos. O tratamento muda, muitas vezes fica evidente que é porque sou uma figura pública. Antes disso, passei por situações desconfortáveis, fui levado a elevador de serviço, fui revistado à toa pela polícia. Tudo isso acabou quando chegou a fama.
Você tem medo do que? Por quê?
Tenho medo de não ter mais as boas ideias, da criatividade terminar. É uma paranoia recorrente. Toda vez que escrevo um bom texto, penso: e se esse foi o último legal e daqui para frente só me ocorrer porcaria. Para isso leio, vejo vídeos e filmes inspiradores e a paranoia passa.
Como você faz para estar de bom humor sempre? Qual a receita?
Não conheço ninguém que está sempre de bom humor. Todos estamos sujeitos a um mau dia, a uma onda de baixo astral. O ideal é levar uma vida com leveza. O que só é impossível se o meu Botafogo for mal.