A Verdade Corrosiva

Em um passado não tão distante ecoava aos quatro cantos o adágio popular: “Quem fala verdade não merece castigo”. Pois bem, o tempo passou e com ele o caminho foi tomando novo formato e, consequentemente tudo mudou. Nesse curto período do passado não tão distante ao atual momento acredito ter hibernado ou não me ative à “evolução cultural da sociedade”. Os meios de comunicação passaram adotar mecanismos narrativos não muito ortodoxos, porém, buscaram um aperfeiçoamento narrativo, demasiadamente dissonante. Hoje, percebo em quase todo noticiário uma extrema inflexão, onde por vezes determinados interlocutores por falar a sua verdade é tido muitas das vezes como autoritário, fascista ou melhores do que os outros. Daí por diante, é tudo ladeira a baixo, pois o interlocutor será submetido à stalking, cancelamento, disseminação de ódio através dos haters e toda engenharia de conflito que possa existir disponível nas redes sociais. Me parece que buscar a verdade é algo démodé, careta, fora de contexto, ultrapassado, porque falar a verdade hoje em dia é algo raro e indescritível ou mensurável. Destarte, nesse lapso temporal o certo se tornou errado e o errado o correto. Aos que possuem mais de quarenta anos isso é realmente enigmático, talvez por conta da “nossa” avançada idade. Há, que saudade da Democracia “da antiga”, onde todos podiam se expressar sem sofrer qualquer represália, onde os oponentes conseguiam sentar a mesma mesa e discutir os pontos divergentes sem se ofenderem. Que saudade do contraditório, do duelo de narrativas e teses onde todos ao final, apesar de estarem em lados opostos saiam engradecidos com o aprendizado cultural posto no ringue das ideias. Notadamente tomamos consciência do Operação deflagrada através da Polícia Federal que cumpriu mandados de busca e apreensão contra oito empresários supostamente Bolsonaristas, tendo como base trocas de mensagem pelo Whatsapp que incluem a defesa de um golpe de Estado. Aqui não
há se falar em cerceamento da Liberdade de Expressão, sabe por que? Bem, sob minha modesta lente do saber, percebo que a motivação se deu em virtude de mensagens trocadas através de aplicativo de whatsapp, daí é cristalina a ideia de que o formato adotado pelos interlocutores foi no modo PRIVADO, ou seja, não houve publicação nas redes sociais dos investigados, portanto, não deram publicidade às suas mensagens. Em que pese todo aparato judicial utilizado não tive notícia de que as mensagens utilizadas pelos interlocutores estavam
sujeitas à interceptação da comunicação telefônica(grampo), pois caso não estivessem estaríamos diante do instituto do fruto da árvore envenenada e corresponde ao dizer que: “as provas ilícitas acabam por contaminar todas as demais provas que dela sejam consequências e, portanto, devem ser descartadas do processo ou da investigação”. Mas,como diria minha filha do meio, “quem sou eu na fila do pão”. Recentemente chegou ao Brasil o Coração
de Dom Pedro I, que veio para as comemorações do bicentenário da Independência. Vejam a coincidência, há duzentos anos (07 de setembro de 1822), às margens do Ipiranga, o Brasil dizia ao mundo que nunca mais aceitaria ser submisso a qualquer outra nação e QUE OS BRASILEIROS JAMAIS ABRIRIAM MÃO DA SUA LIBERDADE.

Como no atual momento, o Brasil vive sua polarização diametralmente movida pelas paixões políticas, das quais afetam significativamente anossa sociedade e, sobretudo o Estado Democrático de Direito. Nos tempos de D. Pedro a situação era como as atuais e proporcionaram aos cidadãos o desenvolvimento do senso de tolerância, onde os
diferentes tornavam-se iguais. Tomemos por base o legado deixado por nossos lusodescendentes enriquecidos
por um conjunto de preciosidades culturais, étnicas e religiosas, que foram integradas aos costumes nacionais e orgulhosamente assumidas como brasileiras. Vivemos sob a outorga da pena, onde a máxima encontra amparo ao adágio de Maquiavel que aqui me permito realizar uma adaptação sem me desviar do autoral: “aos amigos os favores, aos inimigos os rigores da lei”. O abalo entre as instituições é latente e reverbera em toda nação. Percebemos uma grave e persistente dissonância na fala dos personagens. Como em uma arena de guerra a troca de farpas é compensada pelo poder da penada em que pessoas tidas como primárias, de boa índole são brutalmente taxadas por engendrar atos antidemocratas atentatórias ao estado democrático de direito e, por sua vez demonizadas. Dito isto, me pergunto como realizar esta interpretação perfunctória, sendo anacrônico e operador do direito. Em verdade, as engrenagens dessa força motriz apontam de forma vetorial para o princípio fundamental necessário à saúde de uma nação, a Liberdade de Expressão, calar quem fala verdade é atentar ao próprio caráter. Esse princípio dos princípios está ligado diretamente ao direito da livre manifestação do pensamento, possibilidade de o indivíduo emitir suas opiniões, ideias ou expressar atividades intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação, sem interferência ou eventual retaliação por parte de quem quer que seja. Tal princípio é brindado no “artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos define esse direito como a liberdade de emitir opiniões, ter acesso e transmitir informações e ideias, por qualquer meio de comunicação”. Sabemos perfeitamente haver limites até mesmo para este princípio. Todavia, a interpretação aplicada na atual conjuntura política tangencia aos trilhos do conservadorismo e descarrilham nas estradas irregulares do abuso e do arbitrário. O momento é delicado, onde pessoas “normais” por conta de expressarem suas ideias e opiniões estão sofrendo cerceamento de toda sorte,
inclusive a liberdade. O problema por ser do seu vizinho, mas impede ou garante que amanhã possa ser seu. “Não podemos esquecer de tudo o que Hitler fez na Alemanha era legal”. Em meio a estes trocadilhos de palavras e “letrinhas” estruturadas pelas paixões políticas vividas, me sirvo das sábias palavras daquele que combateu e superou toda ordem de preconceito e cerceamento de liberdades, Martin Luther King para concluir minha retórica e peço a todos a sua melhor reflexão: “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”. Ditadura
se faz de várias maneiras, pois depende apenas da criatividade de seu mentor. Que o coração de Dom Pedro I sirva para nos rememorar e motivar daquele 07 de setembro de 1822. Calar um inocente é escarnecer a Democracia.

Por Dr. Émerson Tauyl
Advogado Criminalista, especializado em Direito Militar e Segurança Pública, com escritórios em São Paulo
e Praia Grande
@emerson_tauyl

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